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quinta-feira, 17 de novembro de 2011

O destino do pato que pensava que era cisne

Era uma vez um pato que pensava que era cisne. Tratava-se de um pato da espécie mais comum, mais feio que o patinho feio da fábula, mas, por razões desconhecidas, imaginava-se uma ave muito mais nobre do que realmente era. Alguns, incomodados com aquele equívoco que só causava transtornos, levantavam hipóteses psicanalíticas sobre o que o teria levado a agir assim. Uns pensavam que, na infância, o pato havia sido criado pela avó, ou então mimado demais pela mãe, e que uma delas, ou ambas, tivesse incutido-lhe na cabeça a ideia de ser maior e melhor que os outros. Mas essa hipótese só era defendida pelos bonzinhos desavisados; observadores vacinados tinham outra, bem mais dolorosa, porém realista e com enormes fundamentos: o pato era filho de chocadeira elétrica!

Entre traumas e paixões que justificavam tal hipótese o pato cresceu e, assim como o da fábula, resolveu ir buscar seu lugar em outro lago. Não adiantaram os milhares de avisos recebidos no lago antigo, onde seus companheiros, já habituados ao seu autoritarismo e à sua mania de se impor a qualquer custo, tentaram lhe convencer a não ir embora, pois não seria em todos os lagos que ele encontraria quem abaixasse a cabeça fingindo concordar cada vez que o ouvissem dizer: “Mas é claro que estou certo! Eu sou um cisne e os outros não passam de patos comuns”.

E lá foi o pato, pata aqui, pata acolá, mudou de lago para ver o que havia e até que se deu bem. O único problema foi que, lá, ao contrário de acostumados sinceros, ele encontrou vacinados que agiam por conveniência, ou seja, ouviam-no dizer que era um cisne, balançavam a cabeça fingindo concordar e, às suas costas, riam-se ou queixavam-se das suas artimanhas para convencer o mundo de que era um cisne. Sim, porque o pato, que pensava não ser pateta, aprontou todas quando mudou de lago, simplesmente pintou o caneco! Surrou a galinha, bateu no marreco, difamou a maritaca, humilhou o periquito, enfim, pensou que estava no seu lago, deitou e rolou!

Pensando que era cisne, o pato quis se aproximar dos mamíferos de grande porte. Exibiu, com grande capacidade de convencimento, sua eloquência de ave pomposa, e foi conquistando seu espaço. Intimidava as aves menores e esquecia-se de que elas, por pesarem menos, tinham maior capacidade de voar e de se fazer ouvir diretamente pelos mamíferos de grande porte.

Porém, nada disso foi necessário. Cedo, ou melhor, em tempo hábil, as aves menores descobriram que de nada adiantaria organizar uma revolta contra o pato que pensava que era cisne. Seria um dispêndio desnecessário de energia que poderia não dar em nada. Logo compreenderam que um pato como aquele teria, mais cedo ou mais tarde, a devida resposta para suas ações aparentemente impensadas.

E, mais uma vez, lá foi o pato, pata aqui, pata acolá, para o meio dos mamíferos de grande porte para ver o que havia. Aquilo o fez imaginar-se ainda mais importante e logo, logo, começou a arrumar confusão com os mamíferos de grande porte, alguns já macacos velhos e sem a menor paciência para “pitís” de patos que pensavam que eram cisnes. Engoliram um, dois, três dos seus ataques de autoritarismo, até o dia em que ele, confiando na impunidade que lhe era atribuída pela sua condição de cisne, caiu do poleiro no pé do cavalo. Dali em diante, nem passou pela fase de criar um galo, até porque o cavalo com o qual ele resolvera criar atrito era fino demais para dar coice em alguém.

Não se sabe quem foi incumbido da indigesta tarefa de digerir o pato que pensava que era cisne (aliás, se algum dos leitores souber se carne de cisne é boa, por favor, informe nos comentários). Tudo o que se sabe é que, tantas fez o moço, que foi para a panela...